Prolongamento da Linha Vermelha a Alcântara

Há alguns dias começaram as obras de expansão do Metro Lisboa, nomeadamente o projeto da Linha Circular. Não vou dedicar mais tempo a "bater na mesma tecla", a obra avança e agora resta-nos lidar com ela de qualquer das formas. Mas no mesmo dia em que se assinou a consignação das obras da circular, quase em jeito de compensação, o Metro divulgou mais detalhes daquela que será das expansões mais importantes de toda a rede: o prolongamento até Alcântara da Linha Vermelha. Hoje, vamos discutir os detalhes desta expansão e o porquê de ela ser tão importante para a AML.

A expansão da rede de metro para a zona ocidental da cidade é uma reivindicação antiga e que custa a acreditar que tenha demorado tanto tempo a ser colocada como uma prioridade nos investimentos do Metropolitano. Em 2017, quando se anunciou o projeto da Linha Circular, o ML esclareceu que em paralelo com a expansão Rato-Cais do Sodré, também estava a ser estudado um prolongamento da Linha Vermelha entre S. Sebastião e Campo de Ourique. Na altura, devido ao financiamento mais apertado que estaria disponível, o Metro estimava que não haveria dinheiro para expandir para lá de Campo de Ourique. 

Isto motivou a que este prolongamento ficasse em segundo na lista de prioridades, aguardando nova oportunidade de financiamento, com o qual talvez já fosse possível passar para lá de Campo de Ourique. E foi isso que acabou por suceder, surge a pandemia e por consequência o PRR. Sendo uma das prioridades deste plano a promoção da mobilidade urbana sustentável, era óbvio que este projeto teria de estar contemplado, o que acabou por suceder, e desta vez com orçamento mais folgado. 

Traçado do Prolongamento da Linha Vermelha a Alcântara

O traçado proposto pelo Metro é bastante sinuoso mas infelizmente não há grande alternativa dadas as zonas que a linha terá de servir bem como a diferença de cotas entre algumas estações. Vamos agora olhar com maior detalhe para cada uma das estações:

Estação Amoreiras

A primeira estação do prolongamento será nas Amoreiras, mais precisamente junto ao cruzamento das Avenidas Conselheiro Fernando de Sousa e Eng. Duarte Pacheco. Esta estação deverá ficar a uma profundida reduzida, cerca de 18 metros, sendo escavada com recurso ao cut and cover (a céu aberto). 

Localização da Estação Amoreiras

Note-se que toda a praça do Alto das Amoreiras será requalificada e reorganizada num âmbito de outro projeto da Câmara Municipal, o que deverá contribuir para uma melhor acessibilidade a esta futura estação de Metro.  


A zona das Amoreiras será requalificada e serão feitas alterações à circulação rodoviária

Estação Campo de Ourique

Depois das Amoreiras, o túnel executa 2 curvas até chegar à estação de Campo de Ourique, localizada junto ao Jardim da Parada, no centro do bairro. Esta estação já terá uma execução mais complexa, em parte por ficar a uma profundidade considerável, 35 metros, e por ter de ser escavada com recurso a NATM (New Austrian Tunneling Method) ou como costumamos chamar em Portugal, escavação em mina. 


Localização da Estação Campo de Ourique

Devido à solução construtiva que se pretende adotar, é provável que o próprio Jardim da Parada sirva para abrir um poço de ataque ou de ventilação para permitir o acesso ao túnel. A estação deverá servir o Bairro de Campo de Ourique bem como a zona dos Prazeres.

Estação Infante Santo 

A estação Infante Santo promete ser um desafio construtivo, não só por estar localizada numa zona de difícil acesso mas também pela pendente agressiva da Avenida que lhe dará nome, o que se vai traduzir numa diferença de cotas considerável entre as pontas da estação (segundo o metro a profundidade média rondará os 19 metros). 


Localização da estação Infante Santo

Esta estação ficará entre a Tapada das Necessidades e a Av. Infante Santo e servirá maioritariamente a zona da Lapa e Janelas Verdes, sendo talvez a menos movimentada das 4 novas estações.

Estação Alcântara

A estação de Alcântara será um elemento critico em todo este prolongamento e revela-se um verdadeiro desafio. Em primeiro lugar o relevo do Vale de Alcântara é muito difícil, o fundo do vale é percorrido pelo Caneiro e futuramente pela ligação ferroviária entre a Linha de Cascais e a Linha de Cintura. Além disso, o desnível desde entre Alcântara e as estações mais altas como as Amoreiras é enorme.

Todos estes grandes constrangimentos levaram o Metro a decidir construir a estação em viaduto sobre a Avenida de Ceuta e não no subsolo como estamos habituados. Trata-se de uma decisão mais que acertada, de facto seria extremamente complexo fazer ali uma estação em subterrâneo cuja construção não trouxesse grandes problemas e só para se conseguir vencer o tal desnível seria necessário tornar todas as outras estações desnecessariamente profundas e complexas. Note-se, no entanto, que provavelmente será necessário demolir alguns edifícios para construir a boca do túnel nas Necessidades, mas tratam-se na sua maioria de edificado antigo e degradado. 


Localização da Estação Alcântara

Esta nova estação de Alcântara, localizada junto à estação ferroviária de Alcântara-Terra será um importante interface de transportes. Além da correspondência com o comboio e inúmeras carreiras da Carris, será ainda o ponto de articulação da rede de Metro pesado com o projeto de Metro Ligeiro LIOS que servirá zonas como a Ajuda, Alto do Restelo, Miraflores e Linda-a-Velha. 

Mapa do Metro Ligeiro LIOS previsto para a meia encosta

Segundo a CML está ainda em estudo a possibilidade já muito falada de criar um interface neste ponto com o serviço da Fertagus que atualmente passa na estação inacabada do Alvito. A criação deste interface seria extremamente importante para a AML no seu todo, promovendo a intermodalidade e melhorando o acesso à zona ocidental de Lisboa a partir da Margem Sul do Tejo. Todavia essa opção teria de ser articulada com a gestora de infraestrutura ferroviária, a IP.


Comboio da Fertagus a passar no viaduto sobre a Avenida de Ceuta

Apesar de implicar um pequeno trajeto a pé, será ainda possível apanhar a carreira de elétrico 15E da Carris, que nos próximos anos será expandida à Cruz Quebrada e a Santa Apolónia. 

Mas...

O caro leitor deve estar a perguntar-se: "então e a Linha de Cascais?". Infelizmente Alcântara é um emaranhado de meios de transporte diferentes e a Linha de Cascais corre muito encostada ao rio nesta zona. Desta forma, não haverá um interface direto com esta linha suburbana, é um compromisso necessário para servir melhor a zona e potencialmente a Fertagus. No entanto, para quem estiver à mesma interessado no transbordo, o percurso a pé não é demorado, são apenas 10 minutos entre as duas estações. 

Note-se que um dos motivos pelos quais a estação foi localizada neste ponto foi precisamente a construção de uma futura nova estação de Alcântara-Terra, no subsolo, que servirá a ligação entre as Linhas de Cascais e Cintura, por isso, o interface talvez não seja impossível dentro de alguns anos.


Render da entrada para a nova estação subterrânea de Alcântara-Terra

Penso que só esta estação de Alcântara já justifica bem a enorme importância desta obra para Lisboa e outras zonas mais periféricas.

É ainda de notar que o termino (troço final da linha onde se parqueiam e invertem os comboios) da Linha Vermelha já será, provavelmente, parcialmente escavado na encosta do Monsanto. Isto deve-se à falta de espaço em Alcântara mas pode também ser o sinal de que a Linha Vermelha não se ficará por aqui, podendo um dia ser expandida mais além. 

Então e Campolide?

O caro leitor também se deve estar a perguntar "e não haverá nenhuma nova estação em Campolide?". É um boa questão e a resposta não é muito simples. 

Sim, de facto já esteve planeada a construção de uma estação chamada "Campolide" na Linha Vermelha, a localizar no topo da Rua de Artilharia 1. Contudo, essa ideia parece ter sido abandonada porque essa estação ficaria demasiado próxima da estação Amoreiras (acabando por canibalizar a procura entre as duas). Para ter uma estação "Campolide" no topo da Rua Artilharia 1 seria, por isso, necessário deslocalizar a estação Amoreiras mais para sul para uma zona onde a sua construção seria muito mais complexa, tendo ainda implicações ao nível do traçado da linha. 


Localização que chegou a ser prevista para a estação Campolide

Mantendo a localização escolhida para a estação Amoreiras, seria possível construir uma estação Campolide mais adequadamente espaçada na Rua Marquês da Fronteira em frente ao Estabelecimento Prisional de Lisboa. Mas essa localização seria pouco interessante, a estação ficaria muito longe do Bairro de Campolide ou da Universidade Nova, servindo apenas o topo do Parque Eduardo VII e alguns quarteirões da Rua Castillo. Aliás, seria quase irónico dar o nome "Campolide" a tal estação visto que o Bairro que lhe daria nome ficaria muito mais próximo da estação Amoreiras. 

Quanto à estação ferroviária de Campolide, é um não assunto. Localizada no fundo de um vale, passar lá obrigaria a um enorme desvio da Linha e a construir parte do percurso em viaduto dada a enorme diferença de cotas entre a estação e as zonas de S. Sebastião e Amoreiras. Nada totalmente impossível mas desnecessariamente complexo e caro tendo em conta que o interface com o comboio pode ser feito em Alcântara. 

Podemos por isso concluir que, ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não faz sentido por enquanto construir uma estação Campolide neste prolongamento. Note-se contudo, que o traçado prevê uma reta na zona da Rua Marquês da Fronteira, isto significa que, se no futuro, se o desenvolvimento da zona o justificar, seria possível criar ali uma estação sem grande complexidade.  

Em suma, o prolongamento da Linha Vermelha até Alcântara será uma obra estruturante para a cidade de Lisboa que colocará termo a décadas de reivindicações e esquecimento da zona ocidental de Lisboa. O interface com o LIOS e o comboio torna esta expansão ainda mais critica não só para Lisboa mas também para a AML no geral. Trata-se de um investimento mais que justificado que aliás só peca por tardio. 

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