O Acesso Ferroviário ao Aeroporto do Porto 

Hoje vamos falar daquele que pode ser dos investimentos com mais retorno em toda a nossa rede ferroviária nacional: o acesso ferroviário ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro. Porque é que precisamos dele? Que potencial e abrangência tem este investimento? Em que moldes deve ser feito? Vamos tentar responder a estas questões. 

O acesso ferroviário ao Aeroporto da Invicta é um tema já com alguns anos, que começou a ser discutido mais seriamente após a construção do atual terminal principal do Sá Carneiro nos anos 2000 e com a discussão em torno da Alta Velocidade em Portugal. O novo terminal, além de ter melhorado imenso os padrões de qualidade de serviço e conforto do passageiro, aumentou também muito a capacidade do aeroporto. Isto, conjugado com o facto de o Porto ser a grande área metropolitana do noroeste peninsular, acabou por permitir que o Sá Carneiro se tornasse não só o principal aeroporto do Norte do país mas também da Galiza, especialmente por ter alguma oferta a nível de longo curso, ao contrário dos pequenos aeroportos desta região espanhola que concentram tráfego maioritariamente de médio curso, estando muito dependentes do hub de Madrid. 


O Aeroporto do Porto já foi várias vezes considerado um dos melhores da Europa

Isto leva-nos até às nossas duas primeiras perguntas: Porque precisamos do acesso ferroviário e que potencial e abrangência poderia ter? 

Em primeiro lugar, ligar a nossa rede ferroviária aos nossos aeroportos tem vantagens claras ao nível da intermodalidade e redução das emissões poluentes. Os aeroportos são infraestruturas que por natureza geram muito tráfego rodoviário e é importante que parte desse tráfego seja substituído por um meio de transporte menos poluente, e muitas vezes, mais barato para o passageiro também. 

O Aeroporto Sá Carneiro já é servido pelo Metro do Porto, através da Linha E, que assegura uma cobertura razoável da cidade mas que ainda assim oferece frequências reduzidas, apenas 2 comboios por hora. Além disso, a linha E termina na Trindade, e não em Campanhã, a principal estação ferroviária da cidade. Isto significa que é praticamente impossível chegar ao Aeroporto de forma exclusivamente ferroviária num tempo razoável e competitivo com o transporte individual. 


Estação do Metro do Porto no Aeroporto

Além disso, a abrangência da rede de Metro, com exceção talvez da Linha da Póvoa, tem um caracter mais urbano, enquanto que o comboio consegue atrair passageiros de meios mais suburbanos, por exemplo, de Aveiro, Ovar, Espinho, Trofa, Guimarães e Braga. Ou seja, se queremos de facto conectar toda a "coroa" de cidades e áreas urbanas que rodeiam o Porto, ao Sá Carneiro, é preciso criar um acesso em ferrovia pesada. 

Além disso, a área de abrangência do Aeroporto do Porto chega praticamente a Coimbra, o que significa que existe também potencial na ligação de alguns serviços de longo curso como IC ou Alfa ao Aeroporto. 

Como se estas razões não fossem suficientes, e tal como falámos anteriormente, é impossível ignorar a posição privilegiada do Sá Carneiro para captar passageiros no grande mercado que é a Galiza, uma ligação ferroviária, seria fundamental para atrair mais passageiros desta região espanhola que já possui laços muito fortes com o Norte de Portugal em termos económicos e culturais. 

Creio que está mais que justificado o investimento nesta ligação, mas agora importa saber em que moldes ela pode e deve ser feita. Vejamos.

Como falámos, este tema surgiu também por arrasto da discussão da Alta Velocidade, nomeadamente a nova LAV Porto-Vigo. Atualmente, o PNI2030 prevê a construção da primeira fase dessa LAV entre Braga e a fronteira com Espanha (com um custo estimado de 900 milhões de euros), deixando a segunda fase entre Braga e Porto para lá de 2030. 


 LAV Porto-Vigo como consta no PNI2030

Isto significa que não vale a pena ficarmos à espera que a nova linha Porto-Vigo seja totalmente feita porque estamos bastante longe disso, é preciso avançar já com uma ligação convencional mais barata que depois um dia possa servir o fim dessa nova linha Porto-Vigo. 

Felizmente, há uma candidata óbvia a receber esta ligação, a Linha de Leixões, que atualmente passa muito perto do Sá Carneiro na zona de Guifões. Esta linha, de via única, atualmente só serve tráfego de mercadorias para o Porto de Leixões mas está previsto no PNI2030 o seu aproveitamento para linha de passageiros suburbana. De forma a aproveitar esta linha, será necessário requalificar/reconstruir estações e apeadeiros mas também proceder à sua duplicação (algo que em principio não se deverá revelar complexo uma vez que o espaço para a segunda via já lá está). Esta duplicação teria um custo entre os 25 e os 30 milhões de euros, aproximadamente.


Mapa da rede ferroviária da zona norte do Porto (Linha de Leixões a castanho)

A ligação ao Aeroporto, tal como estudado pela IP, poderá ser um ramal que se separa da linha de Leixões na zona de Guifões, aliás, devido à falta de densidade urbana, dificilmente se justificará intervencionar a linha a partir deste ponto, o que significa que o Sá Carneiro poderia ser a estação terminal dos serviços suburbanos que a usassem. 

Este ramal teria aproximadamente 3km e desenvolver-se-ia maioritariamente em viaduto, permitindo ligar o Aeroporto a Campanhã em 21 minutos para os comboios suburbanos e em 18 para os longo curso. De forma a permitir uma frequência considerável de comboios este ramal deveria ser construído em via dupla e não em via única como apontavam os estudos da IP. Além disso, é importante que a própria estação do Aeroporto não limite a capacidade da ligação, ou seja, é importante que não se limite a ter 2 vias terminais e tenha 1 ou 2 vias de resguardo adicionais que permitam por exemplo, um comboio de longo curso ficar parado mais tempo à espera de inverter a marcha não interferindo com os suburbanos. 


Possível traçado do ramal para o Aeroporto

Note-se que esta estação deveria ser construída de forma a permitir que um dia, uma nova linha vinda de norte lá termine, havendo continuidade para o nosso ramal e para a Linha de Leixões. Devido ao facto de o ramal se desenvolver maioritariamente em viaduto, é provável que a própria estação do Aeroporto tivesse de ser elevada, em vez de subterrânea. 

Na discussão acerca da alta velocidade, também foi muitas vezes mencionada a necessidade de construir uma nova linha entre Campanhã e o Aeroporto a alocar para os serviços de AV. O problema desta ideia é simplesmente o seu custo bastante elevado. O Público aponta que tal acesso nunca ficaria abaixo dos 200 milhões de euros, uma vez que se desenvolveria maioritariamente em túnel. Na minha humilde opinião, acho difícil justificar um investimento tão elevado para uma mera redução de tempo entre o Aeroporto e Campanhã e parece-me bastante claro que tal ligação nunca avançará no horizonte 2030, nem no âmbito da nova LAV Lisboa Porto.

Chegou a ser planeada uma estação subterrânea de AV no Aeroporto

Tal ligação, só deverá avançar numa fase posterior a 2030, inserida na 2ª fase da LAV Porto-Vigo e mesmo assim, acho que teria de ser justificada com uma possível saturação da Linha de Leixões ou do corredor entre Campanhã e Contumil. 

Assim, podemos concluir que o acesso ferroviário ao Aeroporto Sá Carneiro seria uma obra de grande valor acrescentado, não só em termos de melhoria da mobilidade dentro da AMP, mas também em ganhos ambientais e de competitividade do próprio Aeroporto ao permitir atrair ainda mais passageiros do mercado da Galiza. A facilidade de construção desta ligação acaba por torná-la relativamente barata e ainda permite rentabilizar o aproveitamento para passageiros da Linha de Leixões. Trata-se de uma obra prioritária no panorama da ferrovia nacional e de excecional utilidade. 

Tomás Ribeiro

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